Cuitelinho
“Cheguei na beira do porto
Onde as ondas se espáia
As garça dá meia volta
E senta na beira da praia
E o cuitelinho não gosta
Que o botão de rosa caia, ai, ai, ai”
Começo o texto dessa semana destacando essa canção belíssima que a ouvi pela primeira vez num disco de Milton Nascimento em 1988.
A serenidade com que a saudade é retratada nos versos de Paulo Vanzolini torna a canção ainda mais exuberante e nostálgica. É uma expressão poética que mergulha na temática da saudade e da conexão com a natureza. A música começa descrevendo uma cena à beira do porto, onde as garças voam e se assentam, e o cuitelinho – que pode ser uma referência a uma pessoa querida – não aprecia a queda de uma rosa.
O cuitelinho, que é uma denominação regional para o beija-flor, nos traz a beleza e a leveza de sua áurea alardeada por jardins encantados. Esse bichinho que Deus inventou tem os melhores significados. Um bicho cuja existência envolve ficar beijando flores. Aquele barulhinho de suas asas batendo incessantemente enquanto ele está explorando romanticamente a flor. Ele paira no ar, como um mistério, como um segredo, como alguém que está ali pronto a dizer algo importante.
Dizem que os beija-flores escondem significados surpreendentes ao longo da civilização e variam de acordo com as diferentes culturas. De mensageiros divinos a protagonistas de lendas encantadoras, esses pássaros coloridos, além de serem muito bonitos, também nos chamam atenção por serem os menores do mundo e pelo voo peculiar e misterioso. Para algumas culturas são seres que nos conectam com o divino e com almas que não existem mais. Para outras, atraem boa sorte e bons presságios.
A música, portanto, fala sobre a experiência humana de saudade, a beleza e a dor que ela traz, e a maneira como ela afeta nossa percepção do mundo ao nosso redor.
Que a leveza de seu voo e a parada no ar nos faça não só apreciar a beleza desse momento, mas encontrar um equilíbrio em nossas vidas somando saudade e o momento atual por dias melhores.