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A ARTE DE VIVER ( por Wellington Miranda)
Entretenimento
Publicado em 29/05/2024

A arte de viver

 

Encontrei recentemente numa plataforma de streaming uma declamação de um poema de Fernando Pessoa, representada magnificamente pelo eterno Jô Soares. Lembro-me que esta declamação eu a tinha gravada em uma fita K7, e que me chamou muito atenção na época pela sensibilidade da história narrada e, claro, a interpretação desse grande artista. 

Por declamação entende-se o discurso judicial ou deliberativo ambientado em uma situação fictícia, que surgiu no contexto de aprendizado da oratória na escola dos Sofistas – isso segundo o site Wikipédia. A arte de declamar poemas é a habilidade de recitar ou apresentar poesias de maneira expressiva ou envolvente, com a combinação de elementos emocionais contidos na poesia. 

Para lermos bem um poema acho que são necessárias algumas situações como a escolha do poema, a sua compreensão e a sua entonação específica. A entonação, então, é a sua voz, o volume e a velocidade com que você lê com uma postura adequada enquanto você fala. 

O texto poético permite um desdobramento estético, sua leitura em voz alta configura uma nova forma de arte onde a declamação se espalha causando alvoroço a quem escuta e presencia.

Ao ouvir essa declamação do poema “Cruzou por mim”, de Fernando Pessoa, fui tocado pela sutileza com que o interprete Jô Soares fez daqueles versos singulares e belíssimos por si só, ganhassem uma dramaticidade imensurável do autor. 

 

                    “(...) Não: tudo menos ter razão!

                     Tudo menos importar-me com a humanidade!

                     Tudo menos ceder ao humanitarismo!

                     De que serve uma sensação se há uma razão exterior para ela?

                     Sim, ser vadio e pedinte, como eu sou,

                     Não é ser vadio e pedinte, o que é recorrente:

                       É ser isolado na alma, e isso é que é ser vadio,

                       É ter que pedir aos dias que passem, e nos deixem, e isso é que               

                       é que é ser pedinte. (...)”

 

A exaltação do intérprete sucumbe a extravagância da beleza exaurida por diversas vezes nos poemas de Fernando Pessoa, e este em questão, me fez há trinta anos atrás acreditar que o a humanidade tem realmente seus momentos inexplicáveis de euforia. E essa euforia voltou recentemente quando ouvi novamente essa exaltação à beleza da poesia. 

 

                “(...) tudo é mais estúpido como um Dostoievski ou um Gorki.

                Tudo mais é ter fome ou não ter que vestir.

                E, mesmo que isso aconteça, isso acontece a tanta gente

                Que nem vale a pena ter pena da gente a quem isso acontece. (...)”

 

A arte de declamar tem suas raízes em tradições antigas onde as histórias e poesias eram transmitidas verbalmente de geração em geração. Declamar poemas é uma forma poderosa de expressão artística – o que nos leva a crer que realmente viver é uma arte, porém poucos nascem artistas.  



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