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NÃO DIGA QUE A CANÇÃO ESTÁ PERDIDA (por Wellington Miranda)
Entretenimento
Publicado em 28/02/2024

 

Não diga que a canção está perdida

 

Recentemente li uma das biografias de Raul Seixas, e é fascinante o que se pode destacar dessa trajetória tão marcante na música popular brasileira. Principalmente, quando fazemos alusão a seu parceiro principal nessa caminhada. Eu falo do escritor Paulo Coelho – biografia sua que também tive o prazer de ler e conhecer sua ascensão na literatura tornando-se um dos escritores brasileiros mais lidos no mundo. 

Essa parceria é o que chama atenção na trajetória desses grandes ícones da cultura brasileira. Paulo e Raul produziram algumas das canções mais poderosas, do ponto de vista da ressonância cultural, na década de 1970. Em algumas entrevistas, o escritor diz que o relacionamento passou por altos e baixos em meio à composição de grandes sucessos, censura, misticismo e consumo de drogas. 

Nas duas biografias que eu li, percebe-se um destaque negativo dessa relação tão celebrada.  O escritor diz que as feridas já foram cicatrizadas, lembrando do episódio em que foi preso por causa das letras das músicas, e que naquele momento não teve nenhum apoio do amigo. A partir daí, a amizade nunca foi a mesma. Eles até ensaiaram uma volta, mas não deu muito certo. O último encontro deles, após um pedido feito pelo produtor e amigo Roberto Menescal a Paulo Coelho, teria acontecido num hotel na divisa de Minas Gerais e do Rio de Janeiro. Coelho não queria encontrar Raul em São Paulo, e Raul não queria ir ao Rio. A ideia é que eles fariam novas músicas juntos, mas depois de cinco dias esperando o cantor – que estava trancado dentro de um quarto do hotel -, Coelho acabou desistindo da ideia. 

De certa forma, as revelações também deixam dúvida sobre os caminhos que a dupla poderia ter seguido, caso a relação com a ditadura tivesse sido outra. 

O cantor e o escritor se conheceram em 1972, graças ao interesse em comum em ufologia, misticismo e esoterismo.  Coelho apresentou Raul – um careta, na época - às drogas, e o aspirante a roqueiro ensinou o mago a compor. Os dois com personalidades distintas, o que gerou alguns conflitos entre eles. 

Os momentos felizes, entretanto, foram vários. A exemplo do primeiro encontro deles e das viagens que faziam de carro, do Rio para a Bahia. O gatilho para a composição de Gita, um dos maiores sucessos de suas carreiras, veio em um desses itinerários.  

Entre 1973 e 1978, os dois compuseram juntos mais de 30 canções, durante uma relação que teve altos e baixos, com momentos de intensa colaboração e outros de competição e desentendimento. No entanto, a parceria entre os dois foi fundamental para a criação de algumas músicas mais marcantes do cancioneiro popular.  

O autor de O Alquimista afirma que sempre foi muito criticado por fãs do Raul, que o culpam pela morte do astro do rock, o acusando de introduzir o Maluco Beleza às drogas. Paulo Coelho não nega, mas ao mesmo tempo lembra que quando conheceu o parceiro, ele já era casado, tinha uma filha, ganhava dinheiro e se sustentava, e que não foi forçado a nada. 

Hoje, depois de mais de três décadas da morte de Raul Seixas, a sua obra continua viva, e talvez a “Sociedade Alternativa” de que tanto queriam criar, faria mais sentido no momento atual em que às vezes ficamos tão polarizados politicamente - necessitando de uma voz que nos lembre que a canção e a esperança não podem se perder. 

 

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